Estadão Conteúdo
A deterioração da economia brasileira, a queda na arrecadação e a
crise provocada pelos escândalos de corrupção na Petrobras fizeram
queimar na fogueira os recursos para que prefeitos do Nordeste possam
organizar as tradicionais festas de São João, que se iniciam nas
próximas semanas. No interior dos estados, principalmente da Bahia, as
festas juninas são o principal evento popular do ano, atraem turistas,
movimentam as economias locais, geram empregos e garantem dividendos
políticos para os prefeitos.
"Ou eu pago a folha dos professores ou eu faço o São João. Não tem outra
saída", desabafa a prefeita de Cardeal da Silva, Maria Quitéria Mendes
(PSB). Diante de crescentes dificuldades orçamentárias e da queda na
arrecadação, a prefeita optou por uma decisão drástica: cancelou a festa
programada para os 9,6 mil habitantes do município, localizado a 142 km
de Salvador.
"As pessoas ficam indignadas com o prefeito, a culpa é sempre do
prefeito, mas a conta não fecha, quando você arrecada menos e gasta mais
com saúde e educação", comenta Maria Quitéria, que preside a União dos
Prefeitos da Bahia.
A mesma decisão foi tomada pelo prefeito Antônio Carlos Paim Cardoso
(PT), do município de Amélia Rodrigues, para quem o São João é
"supérfluo", consideradas as atuais circunstâncias.
"O momento atual não é de fazer festa nenhuma, a gente tem de se
precaver pra passar o ano e ver como vai ficar o andamento da economia",
diz o petista. Nas contas do prefeito, uma festa junina de médio porte
não sai por menos de R$ 200 mil. "Essa despesa é um negócio impossível",
afirma.
Patrocínio
Uma das principais patrocinadoras das festas juninas na região Nordeste,
a Petrobras informou à reportagem que a "totalidade dos investimentos
para o São João de 2015 e para o patrocínio cultural ainda estão sendo
avaliados".
Os prefeitos, no entanto, já dão como certo que a demora na liberação de
recursos significa que não haverá dinheiro da empresa para bancar a
festa desta vez. Em meio à crise com os desdobramentos da operação Lava
Jato, a empresa já encolheu neste ano o patrocínio destinado ao carnaval
baiano.
Em 2014, a estatal investiu R$ 7,7 milhões no patrocínio do São João de
130 municípios - 119 deles da Bahia, 3 no Rio Grande do Norte, 3 em
Sergipe, 2 em Alagoas, 2 na Paraíba e 1 em Pernambuco.
De acordo com a
Petrobras, desde o início do patrocínio ao São João, em 2005, a Bahia é o
estado com o maior número de municípios contemplados.
Um dos municípios beneficiados no ano passado foi Uauá (BA), que tem São
João como padroeiro.
A cidade, conhecida como "a capital do bode",
decidiu fazer um São João mais enxuto em tempos de crise: em vez de dez
dias de festança, a fogueira será acendida por apenas quatro.
"A Petrobras podia tirar uma parte do dinheiro que levaram do esquema de
corrupção e trazer pro São João do Nordeste", diz o prefeito Olímpio
Cardoso Filho (PDT). "Não temos para quem apelar." Com a falta de apoio
da Petrobras e a dificuldade de obter outras fontes de patrocínio, o
prefeito decidiu cortar gastos para fazer uma festa de R$ 100 mil.
No município de Nordestina, o São João da crise terá mais bandas locais e
durará menos dias, informou o secretário de administração da
prefeitura, Giovanni Oliveira. Em Mutuipe, a diminuição dos recursos do
Fundo de Participação dos Municípios (FPM)e uma derrota na justiça por
conta de um processo milionário envolvendo desapropriação de terras
levaram a prefeitura a cancelar a festança - pelo terceiro ano seguido.
Em Candeias, até São Pedro atrapalhou. Castigado por fortes chuvas
recentemente, o município decretou situação de emergência e cancelou por
90 dias todos os eventos festivos, inclusive o São João. Até o
fechamento desta edição, a reportagem não havia obtido retorno do
presidente da Bahiatursa, Diogo Medrado, empresa de turismo vinculada ao
governo da Bahia.
Contraste
Se os pequenos municípios enfrentam uma série de dificuldades, os
grandes ainda conseguem garantir a festa, ancorados na tradição e na
obtenção de diferentes fontes de patrocínio. O São João de Campina
Grande (PB), conhecido como o "Maior São João do mundo" ocorrerá de 5 de
junho a 5 de julho e deve atrair 2 milhões de pessoas.
Em Caruaru (PE), a festa terá show de Elba Ramalho e homenageará o
ex-governador Eduardo Campos, morto em acidente aéreo em 13 de agosto do
ano passado.
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